domingo, 31 de julho de 2011

Dunas e poemas

Amo Natal e seus poetas em cada esquina. Amo, sobretudo as poetisas, essas fêmeas desenfreadas que carregam coragem e quase certezas. Amo Marize, amo Iracema, amo Civone, amo Zila, Ada, Nísia, Auta e tantas outras potiguares que se aventuram a dizer o mundo em palavras, traços e imagens.


No mais, a beleza de celebrar nossos poetas.

O RITO DE CARMEM
Iracema Macedo

Ela é uma forma de alucinação
de hino ao perigo
e ao furor
Perfuma-se com um poema
e se apronta
como quem vai ao cinema
Parece que não há riscos
em tudo que ela faz
mas ela acorda e dorme
sitiada
Mulher em que se atira facas
ela recebe os golpes um a um
Arremessos de perda, luxúria, ciúme
No centro do picadeiro
Um homem de olhos vendados
ameaça matá-la
todas as noites
diante dos aplausos inocentes


Erma
Marize Castro


Recolho-me tão profundamente
que tudo me alcança:
mísseis, desastres, lanças.
Recostada ao rosto de Deus
pedi-lhe a fé perdida
a palavra antiga – invencível.

Ele me deu o mar no nome
e uma fome borgeana, dizendo-me:
Eis sua herança, jovem senhora
de velhíssima alma e furiosas lembranças.


Ada Lima
Feneça na água
a dor de ser
o que não se pode ter.



+ Ada


Ele me deu um buquê.
As flores eram de vidro
lindas
mas cortaram-me os pés
quando o buquê espatifou-se no chão.
Minhas mãos não suportaram o peso.




BOIS DORMINDO
ZILA MAMEDE

A paz dos bois dormindo era tamanha
(mas grave era tristeza do seu sono)
e tanto era o silêncio da campina
que ouviam nascer as açucenas.
No sono os bois seguiam tangerinos
que abandonando relhos e chicotes
tangiam-nos serenos com as cantigas
aboiadeiras e um bastão de lírios.
Os bois assim dormindo caminhavam
destino não de bois mas de meninos
libertos que vadiassem chão de feno;
e ausentes de limites e porteiras
arquitetassem sonhos (sem currais)
nessa paz outonal de bois dormindo.


MICHELLE FERRET



Pré face


Dar a cara a tapa
numa leve busca por luvas ásperas
doar
letras e sentidos
loucos espaços de nada
sendo tudo
As palavras aqui ganham um vestido
colorido ao olhos de quem lê
vestindo a solidão, o amor, as horas de desespero e o prazer
ele está rasgado
esperando colo
...

Nessa hora os homens se apagam
velam a cidade com frio
os ônibus não passam por aqui
nem os velhos,
eles dormem
ficaram só os postes como testemunhas
os prédios apagaram
só restou um vagão aceso
e em mim um incêndio acontece

...

Desejo as cinzas e as oferto.

Um comentário:

  1. É bom ler poemas femininos, numa segunda-feira q já começa agitada. Eleva a alma dos problemas cotidianos. Abs,

    ResponderExcluir